Manifesto: pelo direito de ter filhos

São muitas as lutas das mulheres nos dias de hoje – equiparação salarial, divisão de tarefas no lar, proteção do Estado em caso de violência, legalização do aborto, fim da criminalização da vítima de estupro, direito ao próprio corpo –, mas a verdade é que todas se resumem a um conceito fundamental: o do respeito.

Que a mulher seja respeitada em casa, no trabalho, na cama, no espaço que ela quiser ocupar. Se ela quiser engravidar e parar de trabalhar pra cuidar dos filhos, se ela não quiser ter filhos, se ela quiser deixar o filho com a babá porque é mais feliz trabalhando 12 horas por dia, se ela já fez um aborto. Queremos menos pressão para ser heroínas, menos cobrança, menos culpa.

Mas uma das bandeiras que ainda não vejo sendo levantadas por aí – não me entendam mal, eu levanto TODAS as bandeiras femininas – é a do direito à reprodução. Acho que é porque o assunto é sensível a quem não consegue engravidar (e essas mulheres preferem não se expor) e parece que “não diz respeito” a quem consegue ou não pretende ter filhos.

Então, aqui no Cadê Meu Neném?, é justamente esta bandeira que vamos levantar neste Dia Internacional da Mulher: o direito à reprodução. E, aqui no nosso país, caminhamos a passos de tartaruga para que toda mulher que deseja engravidar tenha seu direito respeitado. Como? Com o amparo da saúde pública, é claro.

Eu levantei informações que mostram quão distantes ainda estamos de poder realizar procedimentos como inseminação artificial e FIV na rede pública de saúde em um prazo satisfatório. Bem, se nem os convênios cobrem ainda estes tratamentos, que dirá o SUS… E olha que o primeiro passo neste sentido foi dado em um distante 1996. Sim. Há mas de VINTE anos. E detalhe: o projeto ainda está “esperando parecer”. (Veja a fonte oficial aqui)

Fiz aqui uma linha do tempo com dados retirados do próprio site da Câmara Federal pra elucidar o tamanho desta luta:

12 de janeiro de 1996: foi aqui que tudo começou. A Lei nº 9.263 estabelece que “o planejamento familiar é direito de todo o cidadão” e define que “entende-se planejamento familiar como conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal”. E ainda traz: “o planejamento familiar orienta-se (…) pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade”. Pois é.

2003: neste ano, foi apresentado em plenário o Projeto de Lei 1.184, que “regulamenta o uso das técnicas de Reprodução Assistida (RA) para a implantação artificial de gametas ou embriões humanos, fertilizados in vitro, no organismo de mulheres receptoras”. Foi quando legalmente foram definidos conceitos como “embriões humanos” e quando surgiu a fala de que mulheres e casais “que tenham solicitado o emprego da Reprodução Assistida” podem ser beneficiários do mesmo.

2005: o Ministério da Saúde tentou, por meio de uma portaria, tornar obrigatório o financiamento da reprodução assistida pelo SUS. Quatro meses depois, o mesmo Ministério voltou atrás e suspendeu a portaria, alegando falta de recursos.

2012: (sim, SETE anos depois) a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania recebeu o requerimento para a “realização de Audiência Pública para debater o Projeto de Lei nº 1.184/2003, que define normas para realização de inseminação artificial e fertilização ‘in vitro'”.

Dezembro de 2012: finalmente, o Ministério da Saúde passou a oferecer o tratamento para infertilidade pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Através da portaria 3.149, foi determinado que fossem destinados R$10 milhões para nove centros de saúde do país.

2015: foi aprovado o requerimento para incluir “convidados para compor a mesa da Audiência Pública para debater o Projeto de Lei nº 1184, de 2003”.

E, de acordo com o site da Câmara (ou seja, seu veículo oficial de comunicação), não aconteceu mais nada. O projeto está “aguardando parecer”.

Na prática, pouquíssimos hospitais no Brasil realizam reprodução assistida de forma 100% gratuita. Entre elas, estão o Hospital das Clínicas, da USP, em São Paulo, e o Centro de Reprodução Assistida do Hospital Regional da Asa Sul, em Brasília. Mas em um país onde cerca de 280 mil casais* convivem com a infertilidade, é muito pouco. A fila de espera chega a cinco anos, tempo que pode ser fatal para mulheres diagnosticadas com baixo estoque ovariano, por exemplo.

Agora, precisamos cobrar das autoridades o andamento desta questão e investimentos em saúde (mais ainda!) para que tenhamos o direito de reprodução garantido.

Este é o nosso manifesto do Dia Internacional da Mulher!

 

*Dados da Organização Mundial da Saúde

 

Foto: Flickr/ Pedro Ribeiro Simões


6 thoughts on “Manifesto: pelo direito de ter filhos

  1. Sisa Responder

    Linda Bandeira levantada!
    Quantos aos planos de saúde, engravidar pra eles,deve ser coisa fora do corpo humano, assim como a boca, porque não aceitam nem pedidos de exames, e muito menos tratamentos, de dentistas .
    Será que vão lançar um plano de saúde : reprodução assistida?
    Ainda temos que caminhar muito, praentender que o desejo de ser mãe é justo, natural , instintivo,e deve servrespeitado e tratado com carinho.
    As escolhas das mulheres devem ser respeitadas: engravidar, tentar engravidar, abortar ….
    Cada uma sabe onde doe no seu coração.
    Se o governo olhar um pouco além do seu próprio umbigo, talvez um dia consigamos.
    Parabéns pelo texto!
    To nessa!

  2. Sil Responder

    Levantar esse assunto é mais que necessário! Parabéns pela iniciativa. Precisamos falar mais sobre o direito da reprodução! Afinal infertilidade é uma doença e o tratamento é um direito de todos!

  3. […] estabelece como obrigatória a cobertura para o planejamento familiar (lembra que falamos disso aqui... cademeunenem.com.br/por-lei-plano-de-saude-cobre-fiv
  4. […] particulares – muitos deles sem nenhuma sensibilidade –, seja por planos de saúde ou pelo gover... cademeunenem.com.br/empatia-com-quem-deseja-engravidar
  5. […] fui ao ginecologista. Naquela época, não tínhamos acesso a tantas informações e não havia conv... cademeunenem.com.br/nao-conseguia-engravidar

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