“Eu sempre soube que queria ser mãe. Casei quando eu tinha uns 35 anos e decidimos ter filhos, porque já morávamos juntos há uns cinco anos. Não demorou muito, não: em menos de seis meses eu estava grávida. Mas nem desconfiava da possibilidade de perdas espontâneas. O médico disse para não fazermos o primeiro ultrassom de oito semanas, e não ficamos sabendo se estava tudo bem. Eu perdi com dois meses e meio. Fui para o hospital sangrando, tomei um comprimido de progesterona, mas não resolveu. Já não havia batimentos cardíacos.
Ninguém fala como é depois de um aborto natural, mas é uma informação importante: se você não faz a curetagem depois de uma perda, pode acabar vivendo a experiência de um miniparto, porque, pelo menos no meu caso, o saco gestacional saiu inteiro. Se eu tivesse sabido disso, teria feito, porque é bem traumático. Foi um caos, devastador. Eu fiquei muito mal e me fechei na minha concha.
Meu marido me chacoalhou para voltar à vida, porque estava quase com depressão. Fiquei completamente desestruturada. Passou um tempo, e tentamos novamente, de tanto falarem que é comum. Mas perdi novamente, com seis semanas. Só que a gente tinha feito ultrassom desde o início. Depois dessa segunda perda, eu fiquei com raiva e sem entender o que estava acontecendo. Duas perdas espontâneas eram demais. Estava determinada até a ir ao Johns Hopkins, um instituto de medicina americano. Tenho uma amiga médica que trabalhava lá e eu ia ficar na casa dela porque queria ter um diagnóstico.
Depois de sete médicos, fui pesquisar e entendi que há poucos especialistas no Brasil que tratam de perdas espontâneas recorrentes, como o dr. Ricardo de Oliveira, aqui de São Paulo. Ele é muito competente e foi a luz da nossa vida. O diagnóstico foi a incompatibilidade entre o casal. Então, tomamos uma vacina e eu tomei um anticoagulante profilático – uma injeção subcutânea na barriga – a gestação inteira desde o momento em que ele nos liberou a tentar a terceira gravidez. Este anticoagulante traz as condições adequadas para a nidação* acontecer de forma efetiva porque a trombofilia, que todo mundo pensa que é a causa de perdas recorrentes, é, na verdade, uma consequência da falta de equilíbrio imunológico no corpo.
Aprendemos com o médico que quanto mais você tenta conceber sem esse equilíbrio, mais pode ter perdas, justamente porque o corpo vai criando anticorpos. E eles aumentam a cada nova tentativa. E o corpo rejeita cada vez mais. Então, depois de todo esse périplo, que durou três anos, veio o Benjamin, já no primeiro mês depois do tratamento. Tive um parto normal e humanizado.
Hoje em dia há tantas possibilidades ao nosso alcance de ter o melhor diagnóstico e o melhor tratamento… é para isso que existe tanta tecnologia! Hoje, o Benjamin tem 2 anos e 4 meses e eu vejo que tudo foi um aprendizado para o meu corpo e tiro só experiências boas disso”.
Carina, 39 anos
*nidação é a fixação do óvulo fecundado no útero.
Foto: Flickr/Erika Mayumi Ozassa
Fernanda 12 de fevereiro de 2017
Eu optei pela curetagem em meus dois abortos retidos para não sofrer este drama do mini parto.
O problema é que há uma grande chance de as curetagens terem ajudado na formação da placenta acreta que quase tirou minha vida duas vezes.
Dilema do inferno!
Lilian 13 de abril de 2018
Carina, eu fiz a AMIU nos dois abortos retidos que tive, mas no primeiro a experiência de parto aconteceu, pois tive que fazer indução com misoprotol para colo do útero abrir, foram quase 12 horas de dor de subir pelas paredes. ? No segundo aborto retido também fiz o misoprotol, mas o colo abriu logo e não senti dor e nem demorou para realizar o procedimento. Ficamos entre a cruz e espada, até porque o atendimento apropriado para as perdas gestacionais não existe, é muito desumanizado.
Pri Portugal 16 de abril de 2018
Tem toda razão, Lilian. Infelizmente precisamos brigar muito para as condições de acolhimento aconteçam nos hospitais e clínicas. Eu sinto muito pelas suas perdas 🙁 Bjinho, Pri