“O médico disse que meus óvulos estavam velhos. Adotamos. Então, descobrimos que o universo não tinha nos abandonado como parecia”

Minha história começa igual a milhares de histórias… conheci o grande amor da minha vida, foquei na carreira, viajei e aproveitei a vida a dois. Ficava adiando a gravidez para o melhor momento. Mas qual seria esse momento?Os 40 anos se aproximaram e, com eles, veio o medo de não ser mãe. Então, partimos para o caminho pelo qual milhares de casais já passaram: da inseminação à fertilização. São momentos difíceis, de espera, ansiedade e frustração. E a pergunta: Por que eu?

Costumamos nos agarrar ao que é conhecido e a emoções já vividas por nossas amigas e familiares: primeiro vem o teste positivo; depois, o dia de contar para a família, o enxoval, o chá de bebê, as fotos da barriga, a porta de maternidade, o parto… e raramente planejamos algo diferente disso.

Confesso que nunca tive aquele desejo de engravidar, mas socialmente esse pensamento é muito reprimido, então eu imaginava como seria o meu bebê e a minha gestação, como eu ficaria linda grávida… mas nada disso aconteceu.

Eu tinha 40 anos quando pensamos efetivamente em adotar – depois que meu médico disse que meus óvulos estavam velhos e me sugeriu buscar óvulos de uma doadora – veio o sentimento: será que eu tenho coragem? Digo coragem de enfrentar todo o processo e uma espera que não termina em 9 meses.

Essa coragem veio à tona com o incentivo de uma amiga que nos levou até o fórum. Tivemos a sorte de participar de uma palestra da juíza responsável do nosso Fórum, que mudou nossas vidas. A dura realidade é que os pretendentes sonham encontrar a criança ideal e foi aí que eu entendi porque demora tanto: pais adotivos esperam por bebês saudáveis, brancos e sem irmãos. Mas o que encontramos hoje nos abrigos são muitas crianças negras, acima de cinco anos, com irmãos e muitas vezes com problemas severos de saúde.

Não se ‘fabricam’ crianças para atender as nossas expectativas. Na real, o processo é muito mais difícil para elas do que para nós, futuros pais. Criei coragem. Coragem de acreditar. Durante as entrevistas com assistentes sociais e psicólogos, precisamos fazer algumas escolhas: sexo, cor, doenças… é um momento difícil porque engravidar não permite escolher, apenas aceitamos. Nós não selecionamos sexo, nem exigimos um bebê e demos preferência para a cor negra.

Então descobrimos que o universo não tinha nos abandonado como parecia. Só estava esperando que a gente se tornasse mais maduro e merecedor do que estava por acontecer. Porque é preciso, sim, ter coragem, preparo e amadurecimento para se permitir livrar de preconceitos e adotar um filho diferente.

Depois de 11 meses o meu telefone tocou. E, olha, não foi no melhor momento: não tínhamos a tão famosa estabilidade, estávamos passando por uma fase de mudança profissional… A voz do outro lado da linha me passou um breve histórico sobre a criança: um menino pardo, com mais de 1 ano, que tinha uma história de doença infecciosa, já em tratamento. Sem gaguejar eu respondi: SIM! É ele! Eu tinha certeza.

Liguei chorando para o meu marido, que do outro lado da linha começou a chorar também. Foi a noite mais longa das nossas vidas. Não conseguimos dormir imaginando a sua carinha, o seu jeito, o seu cheiro… se ele iria gostar da gente, como era o seu nome. Dormimos Homem e Mulher e acordamos Pai e Mãe.

Do telefonema até a hora em que entramos no abrigo durou menos de 24 horas. Foi quando ele chegou, no colo da cuidadora, e cruzamos os nossos olhares. Ele sorriu e se jogou no nosso colo e eu pensei: Por que eu? Porque tinha que ser eu. Porque tinha que ser a gente. Porque tinha que ser ele.

Meu filho já veio muito independente para uma criança de 1 ano e, juntos, iniciamos nossa história. Diferente do que muita gente pensa, o fato de não ser um recém-nascido não tira a expectativa de viver os primeiros momentos. O nosso primeiro banho, a primeira noite, o primeiro passeio… porque todos esses momentos foram os primeiros vividos por nós três.

Meu filho não conquistou só o nosso amor, mas o amor das pessoas a nossa volta. Ele é prova viva de que não precisa ser Madonna, nem Angelina Jolie e Brad Pitt, para realizar adoções inter-raciais e de crianças maiores.

Sinto que através do meu filho posso ajudar quem ainda não teve coragem de enfrentar os preconceitos por acreditar no amor. Nunca segui regras, sempre segui o meu coração e foi dele que meu filho nasceu. Eu precisava ser sua mãe, ele precisava ser o meu filho.

Hoje, entendo que tudo aconteceu como tinha que acontecer. Para que a gente pudesse viver esse encontro. Porque a vida é feita de encontros. Adotar é muito melhor do que eu já mais pude imaginar”.

 

Camila Caruso, 42 anos, é mãe do Jon Jon, de 2 anos e 8 meses, e alimenta o perfil @jonjonwyatt no Instagram, onde conta a história dele.


7 thoughts on ““O médico disse que meus óvulos estavam velhos. Adotamos. Então, descobrimos que o universo não tinha nos abandonado como parecia”

  1. alice Responder

    este site transborda amor e emoção. todos os relatos me fizeram chorar com a transparência dos sentimos através das palavras

  2. Jonathan visitei. José Alves dos Santos Responder

    Sou negro e particularmente orgulhoso dessa família que tanto admiro . Parabéns Camila pelo seu esclarecimento sobre a adoção e a situação pela qual você passou, fiquei feliz em ler a sua história e saber que vocês estão todos felizes. O amor venceu .

  3. Jonathan visitei. José Alves dos Santos Responder

    Acho de suma importância a divulgação de assuntos dos quais as pessoas teem pouco conhecimento ou nenhum, para que sejamos todos munidos de informações que o governo não se interessa em mostrar.

  4. Crisleide Ap de Souza Responder

    Estou conhecendo o site agora, li algumas histórias e me emocionei, sou de Guarulhos-SP e queria saber se indicam algum médico bom sobre este assunto de não conseguir engravidar (desde meus 23 anos tento e não consigo, hoje com 30 e ainda nada, sem nenhum uso de método contraceptivo) mais uma entre muitas que se decepcionam ao ver a menstruação ali todo mês. Se tiverem indicações, por favor me digam.

    1. Pri Portugal Responder

      oi, Crisleide, posso te escrever para conversar contigo sobre sua história? Seu depoimento pode ser inspirador para outras mulheres. Sobre médicos, estamos realizando entrevistas aqui no site com fontes que nos parecem confiáveis, fique de olho!

      1. Crisleide Ap de Souza Responder

        Pode sim, Pri Portugal, por favor.

  5. Livy Responder

    muito linda a sua história, Camila… parabéns pela sua coragem. muitas vezes é preciso de coragem para ser feliz e fazer os outros felizes!

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